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Entenda como funciona um julgamento, do início ao fim

Entre todos os atores, o juiz tem grande destaque. Apesar do nome, não é ele quem de fato julga o réu, e sim o júri.

Entenda como funciona um julgamento do incio ao fim

Depois de muito ver e ouvir, os jurados se reúnem em uma sala secreta. Um a um, o grupo de pessoas simples escolhidas para decidir sobre o assassinato de uma empresária e de uma doméstica proferiam seus votos. Atento, o juiz acompanhava tudo. Alguns minutos de tensão para os familiares das vítimas e de espera para os demais interessados e coube a Marcelo Soares Cunha, titular da 1ª Vara Criminal de Vitória, dar o veredicto: Cristiano dos Santos Rodrigues e Renato dos Santos Rodrigues eram considerados culpados, o primeiro pela morte de Cláudia Soneghete Donati e de Mauricéia Rodrigues e o segundo por receptação de materiais roubados.

Terminava, na madrugada da última sexta-feira (11), uma sequência de cenas que em muito se assemelham aos pomposos julgamentos de filmes e séries de televisão. Mas o que significa aquele ritual? Que papel desempenham os atores envolvidos em um tribunal do juri atuam e quais são suas responsabilidades? Os diálogos são cheios de expressões difíceis, como na dramaturgia?

O juiz

Entre todos os atores, o juiz tem grande destaque. Apesar do nome, não é ele quem de fato julga o réu, e sim o júri. Cabe ao homem de toga manter a ordem da corte e comandar os aspectos administrativos de um julgamento. Casos de desentendimento entre advogados e promotor e até quando um dos jurados passal mal devem ser resolvidos pelo juiz. É ele também quem deve garantir a segurança dos presentes.

Outra questão importante é o desenvolvimento das ações no tribunal. É comum que um julgamento dure dias. E, durante o dia, horas. Até o fim de 2012 a previsão é de que mais de 600 casos sejam julgados no Espírito Santo. Cabe ao juiz fazer as pausas necessárias para não levar nenhuma das partes à exaustão e, também, proferir a sentença.

Antes mesmo de formar o tribunal, um juiz já começa a trabalhar. É de responsabilidade dele, ao receber a denúncia, instruir o processo, ouvir as testemunhas e colher as provas. Só após esse processo, o magistrado avalia se o caso deve, ou não, ser encaminhado ao tribunal do júri. Nesta avaliação, o juiz pode, inclusive, absolver o réu. Um dos casos onde esse procedimento é mais comum é nas situações que envolvem legítima defesa. Em casos onde o homicídio é verificado, mas não é configurado crime contra a vida, o tribunal do júri não é necessário. Como exemplo, latrocínio, furto seguido de morte.

Caso o réu seja de fato pronunciado pelo juiz (encaminhado ao tribunal do júri), um segundo passo deve ser dado. É neste momento que os jurados são escolhidos e o crime é incluído em pauta. A partir deste momento o réu começa a ser julgado.

Experiente jurista, foi Sérgio Ricardo de Souza, presidente da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages), que comandou sete julgamentos dos integrantes do assassinato do juiz Alexandre Martins de Castro Filho. “Esse é especial porque você está julgando um caso que envolve um colega de trabalho que morreu exercendo a profissão e em decorrência do trabalho que fazia”, relembra.

Sérgio Ricardo de Souza destaca que mandar matar um magistrado é prática exclusiva do crime organizado. “Nos casos comuns que vemos no dia a dia, isso não acontece. Essa criminalidade organizada é a mesma que mata as testemunhas, promotores e todos aqueles empenhados em fazer a justiça acontecer. Até mesmo por isso tomamos muito cuidado com a segurança dos jurados”, explica.

O advogado

No tribunal, cabe ao advogado sustentar uma tese. Seja de defesa, em benefício do réu, ou de acusação nos casos em que o Ministério Público utiliza um advogado auxiliar para fazer as denúncias. Entre as diversas formas que um advogado pode atuar em determinados julgamentos, algumas se destacam.

No caso de réus confessos, ou seja, que assumem o crime, o papel do advogado é sustentar a tese de um homicídio simples ou desqualificar a agressão. De alguma forma, o profissional tenta amenizar a pena do cliente. Em situações onde o réu não confessa os crimes, os advogados usam a tese de negativa de autoria, onde os acusados não assumem o ato.

Com mais de 20 anos de atuação na área penal, Clóvis Lisboa conta que o papel do advogado se tornou muito importante com as mudanças na lei. “Hoje o réu não precisa mais estar presente para ser julgado. Só o advogado basta”, diz. Ele lembra ainda que, em casos onde os acusados negam os atos, as chances de insucesso dos advogados é muito grande.

“No papel de júri a prova cabal não é mais necessária. Só os indícios bastam. Por exemplo, na faculdade aprendemos há mais de 20 anos que onde não existe cadáver não existe crime. Mas hoje a história é diferente. Vemos várias condenações sem o corpo”, explica. Já no julgamento, os advogados são sempre os segundos a fazer a oratória. E, caso o promotor não concorde com algum ponto levantado pela defesa, ele tem direito a réplica. Assim como os advogados a tréplica.

Entre os diversos casos que trabalhou, Lisboa lembra de alguns em que conseguiu provar a inocência do réu. “Lembro de uma menina de Vila Velha que era abusada pelo padastro. Além disso, ele também batia na mãe dela. Isso fez com a moça matasse o homem e ficasse presa por três anos. Contudo na hora do julgamento consegui provar a legítima defesa e ela foi liberada”.

O promotor

É regra nos crimes levados ao tribunal do júri que o Ministério Público por meio do promotor faça a acusação. Em alguns casos é comum que um advogado, a pedido de quem acusa, auxilie os promotores nesse papel.

No plenário, o promotor se baseia na acusação feita na denúncia apresentada ao tribunal e a um documento chamado de Libelo. A partir desse ponto ele faz uma oratória que leva cerca duas horas apresentando aos jurados os motivos pelos quais o réu deve ser condenado. Esse discurso é feito com base em documentos arrolados ao processo. O Ministério Público nem sempre pede a condenação do réu. Em casos em que a inocência dos acusados é clara e que não existem provas suficientes para a condenação, o promotor não apresenta denúncia ou pede a absolvição.

Hoje atuando como procurador do Estado, Sócrates de Souza trabalhou muitos anos como promotor. Entre os tribunais que já fez parte, o mais marcante foi justamente o primeiro realizado em Venda Nova do Imigrante, entre 2000 e 2005. “Nessa ocasião, os pais e a sogra do marido eram acusados de matar uma criança de oito meses. Eles a enterraram ainda viva e tentaram matar uma outra criança de três a quatro anos a empurrando ribanceira abaixo. Eles foram condenados e cumpriram pena. A avó apresentou distúrbios mentais e posteriormente faleceu. O mais marcante foi o filho que ficou vivo dizendo que ouviu o irmão chorar embaixo da terra”, recorda.

Os jurados

São escolhidos cerca de 300 nomes em cidades grandes. Todos os anos a Justiça, por meio de entidades representativas da sociedade como escolas, sindicatos, associação de moradores, grandes empresas e órgãos públicos seleciona esse grupo de pessoas para trabalhar nos julgamentos. Os escolhidos passam a ser alistados da Justiça para atuar em casos específicos. Após essa seleção, os nomes são divulgados na imprensa oficial para que seja dada publicidade às escolhas.

Em cada pauta específica, dentro dos nomes selecionados, até 25 são sorteados na presença do Ministério Público e do advogado de defesa para o júri. E entre esses nomes, sete vão de fato formar o conselho de sentença no dia do julgamento. A segunda escolha também é feita por meio de sorteio.

São essas pessoas que determinam se o réu é inocente ou culpado. É importante destacar que os jurados devem ser da localidade onde o julgamento acontece. E que a partir do momento em que entram no tribunal passam a ter poderes de juiz. Eles também ficam incomunicáveis pelo tempo que durar o julgamento. São, inclusive, obrigados a dormir no local. É importante destacar que os jurados estão sujeitos as mesmas medidas de impedimento que os juízes. Não podem atuar parentes próximos dos envolvidos no julgamento e nem pessoas que possuam alguma ligação com qualquer das partes.

Existe ainda por meio da defesa, a possibilidade de recusar até três jurados sem justificativa. Essa tática é muito usada por advogados que não querem no júri pessoas que possam dificultar o seu trabalho. Por exemplo, em um crime que envolva violência contra a mulher, para a defesa, não é bom que muitas mulheres façam parte do júri. A rejeição também acontece para derrubar o número de integrantes no julgamento, e assim ganhar tempo. Da mesma forma o Ministério Público também age para recusar jurados que considera inadequados.

O público

Tribunais do júri geralmente são abertos. Contudo diante de casos notoriamente conhecidos uma seleção é feita. A prática mais comum é distribuir senhas para que a população possa acompanhar os trabalhos. Os maiores impedimentos em relação ao público em um julgamento se dão pela falta de espaço dos tribunais. Além disso também é necessário observar as questões de segurança. Alguns casos devem ser julgados a portas fechadas.

A Toga

Na teoria juiz, promotor, advogados e jurados deveriam usar a toga, mas os últimos, por falta de verba, não fazem essa utilização sempre. A longa capa preta utilizada pelos juristas tem um caráter histórico e cultural. A origem dela vem de Roma e da Igreja Católica, onde os primeiros julgamentos eram realizados. Então a toga serve desde os tempos antigos para representar o poder. E no momento do julgamento, todos os atores citados estão investidos desta função pública que tem a responsabilidade de julgar os demais.

O tempo

Com uma alteração no Código Penal, a operação de um julgamento foi modificada. Alguns anos atrás, por exemplo, era possível que advogados e promotores pedissem que peças inteiras dos casos fossem lidas. Em média, uma peça pode ter até 200 páginas de documentos levantados sobre o processo. Como exemplo, segundo o juiz Sérgio Ricardo, o caso Alexandre Martins está atualmente com 100 volumes de 200 páginas cada. Com a proibição deste procedimento, hoje os julgamentos duram no máximo sete dias.

A previsão da Justiça é julgar até dezembro deste ano mais de 600 casos de homicídio no Espírito Santo. O número é alto e já nos próximos meses alguns casos famosos serão julgados. Os acusados de executar a colunista social Maria Nilce, no crime ocorrido em 1989, vão à júri popular. Também deverá sentar novamente no banco dos réus o empresário Rogério Sepulcri, acusado de matar a mulher, a médica Gilcy Brandão em 2007 na saída do restaurante Rancho Beliscão, em Jardim Camburi.

Fonte: gazetaonline

Consultor Elder

Abr Jurídico

Consulting & Auxiliar Jurídico, Analista de Mídia Social, Escritor, Prático Forense e Cidadão indignado com as injustiças deste mundo.